"As eleições ainda não acabaram, o Presidente da República [Filipe Nyusi] não se tem que pronunciar" em relação à tensão gerada pelo anúncio, na quinta-feira, pela Comissão Nacional de Eleições (CNE) dos resultados, disse à Lusa Fernando Lima, jornalista e analista político.

Lima afirmou que um posicionamento do chefe de Estado seria interpretado como a favor da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder, e que venceu em 64 das 65 autarquias, de acordo com os resultados anunciados pela CNE.

"Este Presidente da República é o presidente de um dos contendores das eleições [a Frelimo], acho que é importante ele não se pronunciar, não fazer pender eventualmente o prato da balanço a favor da formação política que ele dirige", frisou.

Fernando Lima notou que Filipe Nyusi já defendeu o cumprimento da lei na contestação ao processo eleitoral autárquico e ao recurso a meios pacíficos.

Fernando Lima ressalvou que, no geral, as manifestações contra os resultados das eleições gerais têm decorrido dentro da normalidade, tendo em conta o histórico de violência das Forças de Defesa e Segurança moçambicanas.

"Dentro do atual quadro, em que me parece que as manifestações têm decorrido, no geral, com muita normalidade, acho que o Presidente da República também tem que ser contido na sua intervenção", sublinhou.

Gil Laurenciano, analista político e docente na Universidade Joaquim Chissano (ex-Instituto Superior de Relações Internacionais), considera que o Presidente da República deve aguardar pela validação e proclamação dos resultados eleitorais pelo Conselho Constitucional, para emitir a sua posição.

"Ele fez todos os apelos antes das eleições para que tudo isso corresse bem e agora eu acho que ele tem que esperar pelo Conselho Constitucional", declarou Laurenciano.

Considerando os excessos que normalmente caracterizam a atuação das autoridades moçambicanas ao exercício de direitos cívicos, como a manifestação, a postura da polícia e dos líderes das manifestações tem sido "proporcional", prosseguiu.

"Os incidentes" até agora verificados "são normais num contexto de manifestações de multidões", sustentou.

Gil Laurenciano assinalou o compromisso da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), principal partido da oposição, com uma contestação pacífica aos resultados do escrutínio.

"Seria pior se ninguém se manifestasse", porque a manifestação "é uma espécie de válvula, porque nas eleições há muitas frustrações, há muitas expectativas", enfatizou.

De acordo com os resultados anunciados pela CNE, a Frelimo venceu em 65 das 64 autarquias, à exceção da Beira, ganha pelo Movimento Democrático de Moçambique (MDM), terceiro maior partido.

Partidos da oposição, sobretudo a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), principal partido da oposição, têm promovido, um pouco por todo o país, marchas de contestação aos resultados das eleições de 11 de outubro, juntando milhares de pessoas que denunciam uma alegada "megafraude" no escrutínio.

Um agente da polícia e um jovem morreram durante manifestações ocorridas em Nampula e em Nacala contra os resultados das eleições autárquicas, segundo o Centro de Integridade Pública (CIP), uma Organização Não-Governamental (ONG) moçambicana.

O agente terá sido morto em retaliação ao baleamento de uma criança de dez anos, à saída da escola, numa ação enquadrada na reação das autoridades às manifestações contra as eleições autárquicas, na cidade de Nampula, província com o mesmo nome, no norte do país.

Na cidade de Nacala, também na província de Nampula, um jovem morreu depois de ter sido atingido por um objeto contundente no Mercado Central de Nacala, durante escaramuças entre populares e a polícia, avançou o CIP. Os óbitos avançados pela ONG não foram confirmados pelas autoridades.

Nas duas cidades, o comércio paralisou, com os mercados e estabelecimentos comerciais encerrados.

Na cidade de Maputo, a polícia moçambicana fez vários disparos de gás lacrimogéneo sobre milhares de pessoas que se manifestavam.

A polícia moçambicana anunciou, na sexta-feira, o ferimento de 10 pessoas, todas na cidade de Nampula, e a detenção de outras 70 em Nacala-Porto, Maputo, Quelimane e Nampula, autarquias onde decorreram as manifestações.

As sextas eleições autárquicas em Moçambique decorreram em 65 municípios do país no dia 11 de outubro, incluindo 12 novas autarquias, que pela primeira vez foram a votos.

PMA // JPS

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